29.11.08

Ilustração de Paulo Jobim para encarte de Matita Perê, disco de Tom Jobim, 1973.

I-
Madrugada fria azul de medo,
no teatro de barro a terra abria redondo abismo torto, cratera de sonho e de som: palavras cantadas com raíz. Com o norte para o sul foi-se o som ser ouvido; meus ouvidos! O recado abismal geopotência poética rasgou chão e pedra fez tempo cheio e disse ao João que fosse fábula des-sendo João, e que o chamado desdito João, tigre na sela voando rugindo pego por razão nenhuma, também dissesse ao vulgo Leonão que ele também não é ele. E a palavra se refaz, toda vez que alguém-algum lê chão e escreve com flor uma estória de vida inteira.
II- Terra transpassa concreto? Da terra, o sumo, o som.....

III- Concretas sílabas, sintonia, sinfonia, foram feitas passos.

IV- Concretos passos, pisada e pegada dissonante, sustenidos por braço e giz.

V- O som, amanhecido, tem cor laranja e vistas de algodão doce.

VI- De noite, são música as estrelinhas que brilham no céu do meu quarto.

VII- Entrelinhas, a mudez do fruto range verde na mesa.

VIII- Janelas abrem olhos.

XIX- Portas, estradas.

X- Por toda parte na cidade, som, sonho e caminho embrenhando mato no semáforo: sinal verde?

XI- Parte por todo na cidade, som quer homem juntado sinfonia. Epifania. Som procura ouvido que se esqueçe em poesia.

27.11.08

O tempo de lágrimas já foi.
Agora: só rio.....
Riozinho claro e fundo
onde amigos-veredas
são o curso e os peixes.
Hoje só-rio.

24.11.08

Na esquina do clube:
Um gosto de vidro e corte
Poeira na noite
festa negro amor mas é tarde
para o girassol do seu cabelo
pegar o trem azul.

Em toda esquina se vai mais um dia
Em toda curva vão-se certezas retas
Mas a curva dobra para dentro
e não para fora de tudo que você
queria ser.

Na paisagem da janela, um gosto de sol
mas você não quis acreditar
que no trem azul de doido
nada será como antes amanhã.

Estrelas, me deixem em paz:
Tengo dos cruces e um cais;
Saídas e bandeiras hasteadas
ao que vai nascer.

19.11.08

Tratado sobre meninos e pássaros que cantam:

( Na escola)

I- Fica estabelecido por um susto de quem vem por trás do colega
que cada canto merece seu canto.

II- Assim-sendo, é expressamente permitido que meninos assobiem alumbrações
em salas de aula em aula ( quem aprende é tão quieto quanto os quadros-negros são verdes).

III- Passarinhos voam meninos driblando bola perna e vento no recreio.

IV- Inspetoras também podem canto: apitos ventam som de ferro...

V- Provas provam vida?

VI- Relógios e sirenes são cucos empalhados.

VII- Diretoras também.

VII- Um bem-te-vi tentou suicídio: atirou-se frente a um estilingue caído, mas num tinha pedra nem atirador. Era conselho-de-classe.

VIII- Sem crianças, morreu o passarim de des-gosto e des-canto.

IX- A secretária não carimbou o tratado. E quem disse que gaiola amarra som?
Da tumba aos trilhos( cem Rosas espalhadas pelos anos)

Minas tem ouro por dentro. Terra que pode rebrotar: concertar morte em tempos sem tempo. Tumbas também são minas, mas não guardam e sim despejam encantamentos ruas e palavras feitas fluxo à fora. Vida é cavalo em rédea curta, tigre na verdade em baixo de cela: Minas é o pretexto...E a vida também: porque o que vem depois está já em si no antesmente.

17.11.08

Bandeira do Brazil ( para Luciano)

O chamado Bandeira: Maldito Bandeira!
Tremulante e hasteado,
boteco fervilhando chopp gelado:
esperando a estrela da manhã...
Catando solzinhos na beira-mar
achei beirada de um coração.
Coração beijado pelas beiradas,
refez-se o pulso vivo antes estático:
Alvorada em ondas,
fim de tarde visto refletido em olhos
colhidos em favos.
Mar e mel.

11.11.08

-You say stop, i say go. Jules et Jim talvez esteja meio ilegível não por culpa do filme, mas das coisas como andam. Deu saudade de uma não conhecida ingenuidade, onde amigos amam-se irmãos e uma mulher pretensa-amada acaba sendo uma estrada para que a confiança e o amor entre irmãos sejam percorridos. Deu saudade das possíveis lágrimas ao ver o filme e identificar-se, sendo aquela relação algo simples e ordináriamente comum entre pessoas. O ilegível hoje é isso não mais comum, sendo a excessão, o extra ordinário. Saudade da pedra e do estilingue, da travessura, da palavra não sabida e da menina assim dividida. Mais importante que a menina era o amigo. A sorte é que a troca hoje fácil-feita seja apenas a de quem amigo mesmo não é. Jules e Jim podem ainda agora então chorar: amigos sempre são!

10.11.08

-No bojo elástico do ar alto, lá onde nem se conta, estrelas de má fortuna e também as cadentes são sem memória. Caído assim meio místico, o primo aspira os ares da volta. Não ao quando, mas talvez ao onde. Isso porque cada segundo é antecedido a um primeiro. E se o primeiro é o antes-cedido que sucedeu a um outro, voltemos. Ao primeiro antes de tudo, logo ali depois de nada. Lá onde nem se conta: é de onde conto.

Meço a casinha que sei-conheço e conclusão só posso tracejar de que tem o tamanho da minha cabeça. Primo pelo esboço que des-diz vento apontando lugares musicais: um balanço meio feito vermelho, pois é a cor que forma formas já-não-ainda-mais concretas; as ondas de terra des-regular regulando o quique no matinho da dente de leite e o nosso depois banho de mangueira. Nosso deleite. Pro pique-se- esconde que custo encontrar, lugar não há de faltar: meninas enganam meninos que as acham muito ingênuas. E não já é isso uma certa e errônea maldade?! A pureza de não saber-se...Vento desdito é ar que não anda porque se estica. No bojo elástico do ar alto...onde estrelas tocam o teto de minha cama.

Lá mesmo é onde primos esticam-se irmãos. A primazia de brincar de novela no quarto: faz de conta imaginado televisivo, ligado em cabecinhas em comum, todo o depois da semana era sempre aquele um domingo. O quando querendo-se onde. Quarto de cinco lados?

Certa vez sua de acontecer, o casal priminho, dupla dos de aqui nossos de casa, surge com outro alheio aos nossos quatro; dois de lá e dois de cá. Como então um quinto se nosso quearto só se fazia mais um com nossa conta exata? O primo dos primos vinha primando pelo espírito do estômago: Olhos procurando o que pedir dão-lhe a cara chata de quarta-feira. " - Somos domingo pé-de-cachimbo"! E barriga ronca grande é em horas de impedimento. Não nas ditas feitas... Mas o primo dos primos, olhôso, quis ser bala de côco, quitute sagrado da vovó nossaminha mas não dele. Levando o domingo para a cozinha, deixa-nos no quarto sendo todos quatro segundas-feiras: um mês esperando que o primo dos primos não olhasse com os olhos...E o quarto sendo só quarto...

No momento de sua despedida, o entrusão ainda pedindo, olhos-de-mão-erguida, foi-se bolsos cheios pra fora, pra onde adulto não se sabe. Os primos também foram, mas eles só iam para voltar: ar alto, aralto da infância tem elástico em brincadeiras:pular elástico e segundas-feiras. E quando fora-se o ido e sabia-se os voltantes, os primos ficados, mesmo já dormindo, sonhavam sentindo: Já é ainda domingo.

6.11.08

Pomba de Irochima


No céu cinzento
nuvem feia do porvir
cumpriu ordem
obediência quase-meia:
Deitou uma bomba,
Soltou uma pomba.
O sapo letrado
pula coachado
exibindo seu idioma:
No brejo ninguém outro tem diploma.
Meus olhos fabricam colibris: formando forma em idéia vista ao verde.
Ou será: colibris fabricam meus olhos?
Idéia fabrica colibri?
Não. Mas não é um sim...
Colibris voam olhares.

5.11.08

Casa-Negra


Que todos os dias são históricos, o tempo sabe e faz. Mas horas como as de hoje alongam-se em espirais que nem mais se sabe...Barack Obama; primeiro presidente negro norte-americano. No Brasil falar disso talvez seja preconceito, afinal os preconceitos de cá são mais de classe e menos étnicos. Mas como os pobres em seu quase todo formam forma de muitos escravos...Ex-cravos ainda cravados em problemas, alijados de suas questões. Mas o assunto hoje é: Obama.

Em começos dos anos 2000 a odisséia de candangos cobrando de volta o que é seu de fato: Brasília. No calor, no calo, pisado, suado, o choro-chorado da gente estava lá: pés descalços afoitos foiçando dias no alívio dos impróprios pés-no-lago. Pés da gente! Rockfeller mal podia arregalar-se, tinhamos agora-ontem um presidente nordestino, mecãnico, aleijado de ciências e possível ciente de si: era por nós. Mas não era deles, sobre eles, meu pretenso falar? Contando, explico.

No domingo da final-primeira vitória de Lula, estive-estou eu na praia: as bandeiras enrolando lágrimas e as lágrimas hasteando cores: sangue e areia. Nunca antes aconteceu em minhas retinas o povo comemorando algo nem sequer futebol; uma desvivencia onde vida transbordava. O tempo das mudanças não desalcança o tempo. O tempo não é talhado, mas sim tempo um esse sendo outro. Tempo re-evoluindo. Suprimido para junto comemorado: tempo de prazeres. Lembro-sei que sentia o que agora sinto.O povo num sentido, tendo sentido algo não tão racional. O sentido é fluxo de esperança, o esperar fazendo para mais esperar e ir fazendo mais. O mesmo sentido que ali alcançava o povo brasileiro alcançaram os hermanos, bolivianos. Eva e Evo, paraíso possível sem a culpa de Adão. O Éden tardio passou de caravela por aqui, mas se foi...

E o que foi que teve a ver isso com Obama? Já contei, mas ainda não expliquei.
Multidões não de Rockfellers ou de mini-Bush's, mas de Jimmy Hendrix's, nunca de Ronalds, mas de Bob Dylans, as Janis Joplins todas e também os Kerouacs e Londons, todos os Jack's, sabem-sentem agora, no agorinha o mesmo sentido antes aquele de cá. Que o sintam também os de Cuba que já foi até paraíso, que sintam ali-e-alá os do Oriente,Médio, esquerdo, inteiro. Que as havenças desajam as descorduras e a vida seja belo e límpido concerto. Que se Concerte. Afinal, a esperança só é a última que morre por ser-se uma primeira a nascer...